segunda-feira, 17 de setembro de 2007

Cronos - 1993

Apanhei a fama de Guillermo del Toro já ela se agigantava sobre o mainstream americano. Falavam então que era um realizador a ter em conta porque conseguia a improvável proeza de conciliar a sua carreira mexicana (as suas origens) com a hollywoodesca. Sendo que as produções mexicanas lhe garantiam a liberdade criativa e as americanas os dólares. Eu até me entusiasmei com a onda que se criou, pois na altura vira Mimic (que na minha memória ainda surge como um excelente b-movie), Blade II (nada de especial, na verdade, mas bem bom para os actuais padrões dos action movies americanos) e El Espinazo del Diablo (que muito me entusiasmou – talvez, a par de Cronos, o melhor filme dele.) Depois del Toro começou a pôr o pé na pocilga. Tanto Hellboy como o recente e multi-premiado El Laberinto del Fauno, por diversas razões, me esgotaram a paciência enquanto os via.
Cronos, mesmo assim, mantivera-se na minha imaginação como um filme de visão obrigatória. E de facto as altas expectativas em relação a ele não ficaram defraudadas. O que se tornou insuportável neste último El Laberinto aparece-nos aqui como um motivo interessante e genuíno. E esse motivo, que se repete ao longo dos seus filmes, é o florescer da imaginação fantástica/onírica infantil em oposição à severidade pragmática do mundo adulto. As crianças nos filmes de del Toro estão sempre a sós com a sua imaginação, não a podendo partilhar com ninguém, só connosco: espectadores.
Ao contrário do El Laberinto del Fauno, que tenta ter outro fôlego (desculpem a insistência nesse filme, mas ela serve-me para melhor explicar a separação entre o joio e o trigo na obra de del Toro), o despoletar da imaginação de Aurora (Tamara Shanath), a criança, não advém dos conturbados tempos políticos, mas sim da inevitável caminhada para a morte do seu avô (Federico Luppi, grande actuação). A menina “imagina” que o avô a certa altura na sua loja de antiguidades encontra um artefacto ancestral que lhe concede a vida eterna. Isto tudo, como se quer, escondido numa intriga que envolve um capanga (Ron Perlman) que pretende, para o seu tio, o artefacto. Há também por aqui umas pitadas de gore, há dependência (o avô fica dependente das picadas do artefacto que o rejuvenescem), há zombies (Aurora prolonga a vida do avô para além da morte) e outras manhas.
Mas na essência o mais tocante e emocionante do filme reside nesse “embelezamento” que del Toro, através dos olhos da criança, dá à morte do avô (o filme é dedicado no final a uma pessoa, cujo nome não me recordo, mas estou em crer que é uma senhora, talvez a avó de del Toro?) E há uma cena comovente/brilhante: a meio da noite a menina assiste, no topo das escadas de sua casa, ao avô a contorcer-se lá em baixo (narrativamente: devido ao vício de se injectar no artefacto; na verdade: é a hora da morte a chegar), e quando ele repara nela diz-lhe: “No se passa nada Aurora.”

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