quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Quai des Orfèvres – 1947

Os franceses começaram a construir uma enorme reputação nos filmes policiais desde cedo. Este Quai des Orfèvres tem reputação de clássico, do cinema francês no geral, e do cinema policial, seja francês ou norueguês, em particular. Percebe-se claramente porquê, tudo nele é medido com precisão e cosido com elegância de alfaiate. O alfaiate é Henri Georges-Clouzot homem de curta filmografia mas com o igualmente extraordinário Les Diaboliques no currículo. Vejamos então, Georges Brignon (Charles Dullin), velho jarreta, é assassinado em sua casa e, como António Rodrigues da cinemateca muito bem referia, o par de protagonistas sente culpas, cada um por si, pela sua morte. Maurice (Bernard Blier), o marido, queria ver-se livre dele por ciúmes, Jenny Lamour (Suzy Delair), a mulher, também o queria desaparecido para não ver Maurice consumido por ciúmes. A vida do velho irá consumi-los tanto como a sua morte.
O inspector Antoine, veterano de guerra com um filho preto das colónias (Louis Jouvet, actor que desconhecia mas parece que foi grande em França, e por esta actuação bem merece), vai então tentar encostar cada um deles à parede. À medida que a noite de Natal se aproxima o cerco policial vai-se fechando sobre o par de protagonistas, que sentem já não ter escapatória apesar da sua inocência. É então que na noite de Natal o assassinato, por milagre, é transferido para um criminoso em fuga, que o confessa - concordo até que essa transferência surja um pouco forçada, mas não deixa, para católico, de tudo fazer sentido. A intriga também envolve a amiga Dora (bela Simone Renant) que também quererá acarretar as culpas da morte porque não aguenta a possível prisão de Jenny Lamour (tirem as ilações).
Mas todo o filme é excelente garanto-vos. Todas as personagens “respiram”, têm tempo de antena, têm dilemas, dúvidas, fraquezas, têm “corpo”. Clouzot filma muito bem Paris, uma Paris nocturna, coberta de neve, e também uma Paris de interiores, a esquadra, teatros decadentes, etc. Para quem gosta de filmes policiais com classe (tratando o filme até de personagens de classe baixa), este será um verdadeiro festim.

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