sexta-feira, 2 de novembro de 2007

He Fengming – 2007

Wang Bing, segundo consta, fez um dos mais prodigiosos filmes recentes West of the Tracks. Ainda não o vi, mas garanto-vos que quando surgir essa possibilidade é com toda a expectativa que lhe entregarei nove horas da minha vida. Este He Fengming tem um terço da duração daquele monumento, ou seja, são três horas. Três horas ocupadas, quase totalmente, com a senhora He Fengming a divagar sobre a sua memória num tempo conturbado do império chinês. O filme é basicamente isto, variam somente as escalas de plano sobre a senhora e pouco mais. E isto torna-o fascinante porque a senhora He Fengming tem de facto uma história incrível para contar, e conta-a de forma extremamente lúcida e detalhada. É uma história épica que se nos vai compondo na cabeça como se fosse um filme de David Lean ou um Lord of the rings, sem os orcs. Wang Bing fez o filme como uma antítese a esse cinema espectáculo. Aquilo é uma memória pessoal partilhável só pela palavra e não pela imagem. Então para quê filmá-la? Para que sintamos, e vejamos, as memórias a brotarem dela, dos seus olhos, da sua boca, das suas mãos, para que vejamos a noite a cair e a escurecer a sala. Para que nos apercebamos que um Doutro Zhivago, por exemplo, nasce de uma pessoa, de uma memória de uma vida.

Em tempos a cinemateca passou um ciclo chamado os filmes-rio (adoro este conceito), ou seja, filmes enormes, de horas, que têm de ter a fluidez exacta para que aquilo resulte. Têm que se ir instalando em nós. Este He Fengming é um excelente exemplo de filme-rio (daqueles que de tanto baterem na pedra dura, os épicos hollywoodescos, acabam por erodi-la).

Sem comentários: